Divórcio Litigioso: O Guia Definitivo Quando o Acordo Não é Possível
Toda história tem um fim, mas nem todo fim precisa ser o fim do mundo. O divórcio é, muitas vezes, o passo necessário para que novos capítulos possam ser escritos. No entanto, quando o diálogo se esgota e os interesses se chocam, o caminho que era para ser a dois se divide em duas vias que só podem ser reconectadas por um juiz. É nesse momento que entramos no território do divórcio litigioso.
Mas não se assuste com o nome. "Litigioso" nada mais é do que um processo em que as partes não conseguem concordar sobre um ou mais pontos da separação, e um terceiro, o Estado-Juiz, é chamado para decidir.
O que é o divórcio litigioso?
Imagine que o casamento é uma sociedade. Quando ela se encerra, é preciso decidir o que fazer com tudo o que foi construído: os filhos, os bens, as dívidas. O divórcio litigioso acontece quando os sócios, ou seja, o casal, não chegam a um consenso sobre os termos desse encerramento.
A boa notícia é que a lei evoluiu para facilitar a vida de quem só quer seguir em frente. Uma dúvida muito comum é se o processo ficará "travado" por anos até que se resolva a partilha de um imóvel ou de uma empresa. A resposta é não. Hoje, é perfeitamente possível pedir ao juiz que decrete o divórcio primeiro, permitindo que ambos retomem o estado civil de solteiros, enquanto a discussão sobre os bens continua em um processo à parte. Isso traz liberdade e permite que a vida ande. Fez sentido?
Quando ele ocorre?
O litígio nasce da divergência. Os pontos de discórdia mais comuns são aqueles que tocam nos pilares da vida a dois que agora precisa ser desfeita:
Guarda dos filhos e regime de convivência: Com quem as crianças vão morar? Como será a convivência com o outro genitor? Finais de semana, feriados, férias... tudo isso pode gerar atrito.
Pensão alimentícia: Seja para os filhos ou para um dos cônjuges, a definição de valores é um campo fértil para conflitos.
Partilha de bens: A divisão do patrimônio — imóveis, carros, investimentos — é, talvez, o ponto mais complexo, especialmente quando envolve empresas ou bens de alto valor.
Uso do imóvel da família: Quem fica morando na casa até a partilha ser concluída?
Dívidas: Quem paga as contas e os financiamentos feitos durante o casamento?
Há situações, contudo, em que o conflito ultrapassa o debate patrimonial e atinge a integridade física ou psicológica de um dos cônjuges ou dos filhos. Nesses casos, o divórcio litigioso se torna uma ferramenta de proteção, podendo ser combinado com medidas protetivas de urgência, previstas na Lei Maria da Penha, quando aplicável.
Medidas urgentes e provisórias
O processo judicial pode ser demorado, mas a vida não espera, né? Por isso, logo no início da ação, seu advogado pode pedir ao juiz uma série de "medidas provisórias". Elas funcionam como uma organização temporária da vida da família até a decisão final. As mais importantes são:
Alimentos provisórios: Uma pensão fixada logo no início para garantir o sustento dos filhos ou do cônjuge que precisa, antes mesmo de qualquer discussão aprofundada.
Guarda provisória e regulamentação da convivência: O juiz define, de forma inicial, com quem os filhos ficarão e como se dará o contato com o outro genitor.
Afastamento do lar: Em casos de conflito intenso ou violência, pode-se pedir que um dos cônjuges deixe a residência do casal.
Arrolamento e bloqueio de bens: Se houver risco de que um dos cônjuges venda ou esconda o patrimônio para prejudicar a partilha, é possível pedir o bloqueio desses bens.
Além disso, essa fase inicial é crucial para a preservação de provas. É aqui que a estratégia jurídica se mostra fundamental para garantir que documentos importantes não desapareçam e que os fatos sejam registrados corretamente desde o começo.
O fluxo do processo: um mapa do caminho
Entender as etapas do processo ajuda a diminuir a ansiedade. De forma simplificada, o caminho é este:
Petição Inicial: É o documento que dá início ao processo. Nele, seu advogado apresenta os fatos, os fundamentos jurídicos e faz todos os pedidos (divórcio, guarda, alimentos, etc.).
Citação e Contestação: O outro cônjuge é oficialmente comunicado sobre o processo ("citado") e tem um prazo para apresentar sua defesa por meio de um advogado.
Audiência de Conciliação/Mediação: Antes de qualquer briga, o juiz tentará promover um acordo. É uma oportunidade de ouro para resolver tudo de forma mais rápida e amigável.
Fase de Instrução: Se não houver acordo, o processo segue para a fase de produção de provas. É aqui que são ouvidas testemunhas, realizadas perícias (para avaliar imóveis ou empresas, por exemplo) e analisados os documentos.
Sentença e Recursos: Após analisar tudo, o juiz dá sua decisão. A parte que não concordar pode recorrer para um tribunal superior.
Cumprimento de Sentença: Com a decisão final, é hora de fazer valer o que foi determinado: registrar a partilha, cobrar a pensão, etc.
O poder das provas
No direito, alegar e não provar é o mesmo que nada. Por isso, a fase de provas é o coração do processo litigioso. As provas podem ser:
Documentais: Contratos, extratos bancários, escrituras, certidões, declarações de imposto de renda.
Testemunhais: Pessoas que podem confirmar fatos importantes para o processo.
Periciais: Laudos técnicos feitos por especialistas nomeados pelo juiz, como avaliadores de imóveis, contadores ou psicólogos.
E as conversas de WhatsApp, e-mails e posts em redes sociais? Sim, eles podem ser usados como prova, mas com muito cuidado. É fundamental que a obtenção dessas provas seja legal, sem violar a privacidade ou a lei, para que sejam aceitas pelo juiz.
Com ou sem filhos: o foco muda
Quando há filhos, o foco do processo muda. A prioridade absoluta é e sempre será o bem-estar deles. A discussão jurídica gira em torno do chamado princípio do melhor interesse da criança e do adolescente.
As decisões sobre guarda (unilateral ou compartilhada), regime de convivência e alimentos (provisórios e, depois, definitivos) serão sempre tomadas com base no que é mais saudável e seguro para os filhos, e não para satisfazer a vontade dos pais.
Com ou sem patrimônio: o quebra-cabeça dos bens
A partilha de bens em um divórcio litigioso é um trabalho minucioso. O primeiro passo é montar o quebra-cabeça do patrimônio do casal, identificando e avaliando tudo o que foi adquirido durante o casamento (a depender do regime de bens).
E quando um dos cônjuges tenta esconder bens? É preciso agir rápido, com pedidos de busca e bloqueio de bens, quebra de sigilo bancário e fiscal, e outras medidas investigativas para garantir uma divisão justa. A discussão pode envolver também a apuração de dívidas e, para casais empresários, a complexa avaliação de empresas e quotas sociais.
Custos, prazos e riscos
É a pergunta que todos fazem: quanto custa e quanto tempo leva? Não há resposta pronta. O custo e a duração de um divórcio litigioso dependem da complexidade do caso, da necessidade de perícias, da quantidade de recursos e, principalmente, do nível de conflito entre as partes.
É importante conhecer o risco da sucumbência, um termo técnico que significa a obrigação da parte que "perde" o processo de pagar os honorários do advogado da parte vencedora. Ou seja, entrar com pedidos sem fundamento pode sair caro.
A inteligência dos acordos parciais
Litigar não significa que a guerra precisa ser total e irrestrita. Uma estratégia processual inteligente muitas vezes envolve a construção de acordos parciais. Se o casal concorda sobre a guarda dos filhos, mas diverge sobre a partilha de um único bem, por que não resolver o primeiro ponto amigavelmente e deixar que o juiz decida apenas sobre o segundo? Isso reduz o escopo do litígio, diminui os custos e, principalmente, o desgaste emocional.
Perguntas Frequentes
Posso mudar de cidade com os filhos durante o processo? Depende. Uma mudança de domicílio que impacte a convivência com o outro genitor precisa, em regra, ser autorizada pelo juiz ou ter o consentimento do outro lado. Fazer isso sem autorização pode ser visto como um ato prejudicial aos interesses da criança.
Como peço alimentos provisórios com urgência? Através de um pedido liminar, feito pelo seu advogado logo na petição inicial. É preciso demonstrar a necessidade de quem pede e a possibilidade de quem paga. O juiz costuma decidir isso rapidamente, em questão de dias.
O que fazer se o outro cônjuge esconde bens? É preciso agir de forma estratégica. Seu advogado pode solicitar ao juiz uma série de medidas investigativas, como a busca de informações junto à Receita Federal, ao Banco Central e aos cartórios de registro de imóveis, além do bloqueio de contas e bens para evitar que sejam vendidos.